Qual a responsabilidade das empresas privadas em conflitos armados como na guerra Rússia x Ucrânia
Introdução
No presente artigo abordarei a temática das empresas na Guerra da Rússia e Ucrânia, além das responsabilidades atinentes às essas empresas não militares no campo do Direito Internacional Humanitário.
Em primeiro momento deve-se destacar que as empresas ganharam cada vez mais importância nas últimas décadas, por se tornarem economicamente maiores que diversos Estados no globo e atualmente influenciam lideranças governamentais e a população.
No conflito entre Rússia e Ucrânia que teve o seu marco inicial no dia 24 de fevereiro de 2022, quando a Rússia invadiu a Ucrânia. A invasão, uma resposta direta frente a aproximação dos Estados do ocidente à Ucrânia, causou sanções econômicas à Rússia e para os russos ao redor do mundo. Além disso, diversas empresas estadunidenses e europeias que mantinham franquias em território russo anunciaram a sua retirada, dias após a invasão. O qual, juntamente com as sanções econômicas permitiram um enfraquecimento econômico da Rússia a fim de forçar o fim do conflito armado.
No presente trabalho, será abordado preferencialmente o papel das empresas no conflito Rússia x Ucrânia e qual a medida da responsabilidade dessas empresas privadas não militares no tocante ao Direito Internacional Humanitário em um território com conflito armado.
Atuação das empresas privadas não militares na guerra Rússia x Ucrânia
Desde o dia 24 de fevereiro, diversas empresas anunciaram a sua saída da Rússia e Belarus, por conta da invasão à Ucrânia, como grandes marcas de fast-foods estadunidenses, marcas de bebidas, vestuário e diversos outros setores, causando um prejuízo econômico considerável e um aumento de desempregados.
Outro ponto que deve ser levado em consideração é o posicionamento das empresas de tecnologia e de redes sociais que conseguem interferir na guerra de forma mais intensa e significativa que a simples saída das empresas mencionadas.
A título de ilustração, citamos a permissão temporária que a gigante das redes sociais Meta concedeu aos seus usuários para elogiar a violência contra os soldados russos. Essa permissão acarretou na proibição do uso dessa rede social em todo território russo. Cabe colocar em tela, a crescente importância das redes sociais para o estabelecimento de um discurso dominante durante uma guerra.
Já no que tange a SpaceX, empresa privada, cujo dono é Elon Musk, disponibilizou para o exército ucraniano o uso da tecnologia Starlink que permite a utilização de internet de alta velocidade, sem necessitar de eletricidade, permitindo uma vantagem militar considerável.
Atuação das empresas privadas não militares no contexto do Direito Internacional Humanitário
As empresas privadas não possuem um capítulo exclusivo a elas nas Convenções de Genebra, tendo em vista que quando redigidas os principais tratados internacionais que versam sobre o Direito Humanitário, as empresas privadas não tinham a influência e as riquezas como hoje. Porém, nos dias atuais, diversas empresas produzem mais riquezas que muitos países sozinhos[1].
Em primeiro lugar, apesar de não haver um capítulo exclusivo para as empresas privadas não militares nas Convenções de Genebra, é possível perceber sua aplicação para esses entes, como observado por Mongelard. Em termos conceituais, é possível atribuir responsabilidades e deveres às empresas não estatais, como é o caso da Convenção Internacional sobre a Supressão e Punição do Crime de Apartheid[2] e Convenção de Basel[3] (Convenção sobre o Controlo de Movimentos Transfronteiriços de Resíduos Perigosos e sua Eliminação).
Em adição, as empresas foram, na visão de Mongelard, contempladas na Declaração Universal dos Direitos Humanos[4], de forma sutil, mas suficiente para serem responsabilizadas dentro da ótica dos direitos humanos, caso não cumpram com as suas obrigações perante o Tratado.
Voillat (2012, p.1092) indica que a partir dos anos 90, a Cruz Vermelha buscava dialogar com as empresas, tendo em vista essa importância cada vez maior e por conta que essas empresas tiveram importância maior nos conflitosarmados, e em diversas vezes atuam para atingir os seus interesses e por vezes alteram o resultado final do conflito[5].
Voillat ainda mostra que nessa comunicação iniciada no fim dos anos 90 e início dos anos 2000 entre Cruz Vermelha e empresas, os representantes das mesmas tinham desconhecimento da legislação atinente ao Direito Internacional Humanitário e não faziam ideia que havia um dispositivo distinto para regulamentar os direitos humanos em situações de conflito armado.
Porém, como destaca ainda o autor, as empresas geralmente tomam todos os cuidados possíveis para não gerarem dano passível de diminuição de seus poderes políticos, reputação e ativos financeiros. Tendo em vista que investem pesado na contratação de trabalhadores, em estrutura, impostos e não pretendem ver os conflitos armados prejudicar os negócios, usam, por vezes a sua influência política para continuar desenvolvendo as suas atividades sem os problemas dos conflitos armados.
Na visão de Mongelard (2006, p.669) as empresas desempenham diversos papeis em um conflito armado, podendo participar em suas fases iniciais como forma de receita para algum dos lados do conflito, o que possivelmente aumenta a duração do conflito armado[6].
Quanto ao conflito entre Rússia e Ucrânia, cabe instar que diversas empresas saíram da Rússia, por esse medo de serem vistas como financiadoras do conflito. Em contraponto, importante mencionar a Gazprom, empresa de gás e petróleo cujo maior acionista é o governo russo está sustentando a economia russa, o que só demonstra a importância das empresas e seu papel no conflito.
Responsabilidade Civil das empresas por atos contrários ao Direito Internacional Humanitário
Mongelard[7] defende o ajuizamento de ações de responsabilidade civil às empresas que interferirem negativamente em um conflito armado uma vez que, normalmente, as violações do direito humanitário internacional são associadas à responsabilidade criminal.
Importante destacar que diversos Estados não reconhecem a responsabilidade penal de pessoas coletivas, e, portanto, através da responsabilidade civil, é possível condenações pesadas sobre os danos, o que obriga as empresas a mudar. Além do fato, da responsabilidade civil permitir que as vítimas possam ir diretamente ao Tribunal pedir indenizações, necessitando de menos provas técnicas, em relação ao processo penal.
Mas também, outro jurista considera a responsabilidade criminal falha, Andrew Clapham (2017, p.28), discorre que a pressão dos Estados tem mais efeito que qualquer responsabilização pelo Direito Internacional Criminal, pois ao investirem nessas empresas, correm o risco de ajudar na violação do Direito Humanitário.
Como observado nos capítulos anteriores, mesmo não havendo leis específicas e artigos que englobem de jeito claro as empresas privadas na ótica do Direito Internacional Humanitário no cenário internacional, podemos dizer que ainda há uma tendência cada vez maior em responsabiliza-las, tanto como vimos na Convenção de Basel e na Convenção Internacional sobre a Supressão e Punição do Crime de Apartheid, como os Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos[8]. (Mongelard, 2006)
Todavia, nas convenções, tratados e princípios orientadores acima mencionados, não há previsão de um mecanismo para a execução da responsabilidade que possa surgir, ou qualquer obrigação em reparar, deixando para os Estados participantes a escolha de como aplicar as regras. Observa-se uma evolução na criação de mecanismos para execução da responsabilidade dessas empresas pelos tratados, como podemos citar as Normas sobre as Responsabilidades das Empresas Transnacionais e outras Empresas Comerciais na Esfera dos Direitos Humanos, podemos citar também os Princípios e Diretrizes Básicas sobre o Direitos das Vítimas de Violações Manifestas das Normas Internacionais de Direitos Humanos e de Violações Graves de Direito Internacional Humanitário a Interpor Recursos e Obter Reparações (Mongelard ,2006).
Não pode ser esquecido, o artigo 75 do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional[9], o qual demonstra o maior avanço na reparação às vítimas dos crimes. O Tribunal é competente para determinar a extensão e a gravidade desses crimes, porém, deve-se ater que essa reparação determinada pelo artigo 75 do Estatuto de Roma é sanção extra da esfera penal, não tendo uma ótica civilista como já criticado acima por Mongelard, sendo esse proposto internamente no Estado. No entanto, na visão do autor, o artigo 75 estabelece, pela primeira vez, a possibilidade das vítimas das violações em solicitar reparação pela para crimes que lesam a humanidade, nada indicando que não é possível implicar a pessoa coletiva.
Com efeito, Andrew Clapham (2017,p.27) tem a mesma linha acerca da responsabilização das empresas privadas, cita que os julgamentos de guerra ocorridos antes mesmo do Estatuto de Roma, como é o caso de Ruanda e Iugoslávia, deram oportunidade para a responsabilização de indivíduos na esfera internacional, não obstando a responsabilidade também das empresas.
Cabe adicionar que, para a configuração de uma responsabilidade civil, é necessário a violação das obrigações internacionais de direito humanitário, ou seja, o dano e sua relação causal. Essa violação poder da própria empresa ou de outros (Mongelard, 2006).
Na visão de Clapham, há níveis diferentes de culpabilidade das empresas nas violações contra os Direitos Humanos e Humanitários. O grau mais baixo é o mais importante, tendo em vista que não é tão perceptível como os demais, a cumplicidade silenciosa. Ou seja, a empresa podia ter agido para evitar o pior, mas preferiu não se envolver, não quer dizer assim que havia obrigação de intervir, mas quando a empresa atua perto de governos que violem os princípios dos Direitos Humanos e Humanitários, espera-se que ou se afaste ou utilize dessa influência para proteger esses princípios e direitos.
Por tudo isso, ainda para Clapham, a culpabilidade silenciosa é uma forma da empresa estar envolvida diretamente no conflito sem o oferecimento de armas ou instrumentos de torturas[1]. Cabendo adicionar que Mongelard também cita essa modalidade, chamando de cumplicidade e cita que seria possível a responsabilização das empresas e que já há leis de Estados que citam essa modalidade em casos civis como a lei estadunidense. Em casos entre Estados e empresas, a cumplicidade seria com o uso da Teoria da ação conjunta, caso mostre que houve um comum acordo entre as partes para uma finalidade em comum.[11][12]
Contudo, quando se trata de uma culpabilidade grave da empresa, deve-se questionar, como indicar que uma empresa, que é uma criação fictícia pode infringir gravemente as disposições do Direito Humanitário? Há duas formas de responsabilizar a empresa, pode ser por atos próprios[13] , ou também por atos dos seus trabalhadores (Mongelard, 2006).
Nesse último caso, como descrito por Mongelard, a pessoa jurídica pode ser responsabilizada, mesmo que parcial, por uma violação da legislação internacional de direito humanitário por ato de seus empregados, entidades, sociedades, grupos armados ou mesmo um Estado. Essa responsabilidade é comumente chamada de responsabilidade solidária.
Para que surja a responsabilidade da empresa é importante 3 requisitos cumulativos: um ato ilícito por parte do trabalhador; a relação de subordinação e a existência de danos causados pelo agente no exercício de suas funções. Importante mencionar que a ligação contratual não é inteiramente importante nesses casos, sendo a conduta dos diretores da empresa acerca dos trabalhadores e o método de desemprenho dos deveres, determinante para ligar a subordinação. Ou seja, o responsável pelo trabalhador deve ter poderes de supervisão, autoridade e controle sobre a forma como o trabalho do agente é realizado.
Essencial também colocar que, ainda na visão de Mongelard, ligando o parágrafo anterior, se o subordinado desobedecer o empregador, não necessariamente a empresa estará livre da responsabilização por violação de direito internacional humanitário, posto que é possível que a simples instrução para os empregados para cumprirem o direito internacional humanitário, não seja combinada com atitudes da empresa para evitar o dano, assim, responderá a empresa se o trabalhador violar as normas humanitárias na prossecução de seus deveres na empresa.
Cabe adicionar, o direito interno dos Estados Unidos determina que casos onde a empresa tem atividades ligadas ao genocídio, escravidão ou crimes de guerra, violando o direito penal internacional, podem ser responsabilizados pelos tribunais estadunidenses nos termos do “ Alien Tort Statute”. Sendo claro na jurisprudência local, que a utilização dessa lei estadunidense, nesses tipos de crime, não necessita de uma ligação com um Estado (Clapham, Corporations and criminal complicity, p. 219).
Por último, para Mongelard o direito das vítimas a pedir reparação por danos resultantes de violações do Direito Internacional Humanitário teve uma vitória importante na via jurisprudencial na Grécia, no caso Prefeitura de Voioria versus República Federal da Alemanha C-11/2000, o Tribunal entendeu que não havia norma de direito internacional que impedisse os indivíduos de pedir reparação[14]. Ao permitir a reparação, o Tribunal entendeu também que a lei interna (Grécia) vale para indenizações por crimes humanitários e pode-se observar que há essa previsão em boa parte dos Estados do mundo.
Conclusão
Podemos concluir que, ao analisar os principais autores da literatura do Direito Humanitário Internacional acerca da importância e da responsabilidade das empresas privadas não militares nos conflitos armados: Mongelard, Clapham, Voillat, entre outros, destacam, que apesar da extensa literatura acerca do assunto, a jurisprudência e as leis são escassas. No entanto há falta de comprometimento por parte dos Estados em criar novas normas para ficar mais claro os papeis das empresas no âmbito do direito internacional, diferente do que podemos observar nos direitos internos de vários Estados, podendo citar a Grécia e os Estados Unidos que tem jurisprudência consolidada em responsabilização de empresas por violações de Direito Internacional Humanitário.
Na guerra da Rússia e Ucrânia foi observado, em primeiro momento, uma consequência econômica da decisão de empresas de sair do território russo, evitando o enquadramento da culpabilidade silenciosa ou cumplicidade por parte das empresas, embora dificilmente teria qualquer punição em termos jurídicos caso as mesmas mantivessem seus negócios no território russo. Todavia, haveria prejuízo na imagem internacional, e isso sim afetaria a lucratividade, como bem defendido por Clapham. No segundo momento, a Space X influenciou diretamente o conflito armado, contudo, não se pode olvidar que não houve violação até o momento de normas de direito humanitário.
Por outro lado, outras empresas de tecnologia como o Meta, mostraram o lado negativo das empresas no conflito armado, ao permitir postagens ofensivas às tropas russas e ao presidente. Porém, há obscuridade quanto as consequências desses atos, tendo em vista que não há jurisprudência quanto o uso das redes sociais para a propagação do ódio de um dos lados do conflito armado, e a jurisprudência é escassa, sendo clara quando há uma atuação mais danosa por parte da empresa.
Por fim, podemos constatar que é necessário cada vez mais uma percepção por parte dos Estados, bem como dos tratados, dos alcances das empresas privadas nos conflitos armados e violações de direitos humanos, a fim de incluir mecanismos para barrar intervenções negativas no decurso do conflito, seja por financiamento, oferecimento de armas ou apenas a cumplicidade.
[1] Nas palavras de Mongelard “In the nineteenth century, international law was addressed exclusively to states: according to the traditional view, only states and their agents could be liable under international law. However, the proliferation of non-state actors on the international scene, two examples being armed groups and multinational companies, which wield ever-greater economic and social power, has prompted international law to take an interest in this type of entity”
[2] “2. Os Estados Partes da presente Convenção, declarar criminal dessas organizações, instituições e indivíduos que cometem o crime de apartheid.” (o artigo I, número 2 da referida Convenção permite que empresas possam responder pelo crime de Apartheid.)
[3] “” Pessoa” é qualquer pessoa jurídica ou física” (artigo 2 da referida Convenção)
[4] “A Assembleia Geral Proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os órgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efectivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição.” (Preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos, podemos observar que fala-se “todos os órgãos da sociedade”, apesar de não ter uma força vinculante forte, note-se que essa consideração pode servir de “soft Law”
[5] Nos anos 90, a Cruz Vermelha, organização para ajuda humanitária, criou uma lista de circunstâncias que observou necessidade que houvesse maior engajamento da organização e envolvesse as empresas. São essas as circunstâncias como bem apontou Voillat (2012, p.1092) em sua obra Pushing the humanitarian agenda through engagement with business actors: the ICRC’s experience: 1- “ When companies or their representatives are directly or indirectly associated with adverse humanitarian consequences on communities or individuals” ; 2- “When companies or their representatives bring influence to bear on a given situation”; 3- “When companies develop competences or skills that are of interest to the ICRC”; 4- “When companies sell goods or services required for humanitarian operations”; 5- “When companies offer opportunities for partnership”; 6- “When companies are interested in supporting humanitarian operations through cash or in-kind donations”.
[6] “In Colombia, for example, oil companies were obliged to pay a special contribution towards restoring law and order, which took the form of a special tax of $1.25 a barrel. In 1996 this tax brought the Colombian government a total revenue of $250 million. In Angola, during the last ten years of the conflict, it could be claimed that the parties were able to go on fighting only because of the revenues derived by the government side from the oil companies working the offshore oil deposits, and those derived from De Beers by the then rebel force UNITA, which controlled the diamond mines.” Esses são dois exemplos de situações trazidas por Mongelard em sua obra “Corporate civil liability for violations of international humanitarian law” para exemplificar como pode-se haver o financiamento das empresas para uma das partes do conflito armado, permitindo que estenda-o.
[7] Propõe uma reflexão interessante sobre a participação indireta da empresa no conflito armado: O financiamento de forças de segurança pela empresa, com a finalidade de protege-la durante o conflito dá margem à responsabilização da empresa no âmbito do direito internacional humanitário quando esse financiamento ao governo seja em dinheiro ou serviço gratuito às unidades militares estatuais?
[8] Foi aprovada pela ONU em junho de 2011, tem 31 princípios, cujos pilares fundamentais são: 1-Estados devem proteger os Direitos Humanos. 2-A responsabilidade das empresas de respeitar os Direitos Humanos. 3-Reparar os danos cometidos em face aos Direitos Humanos pelas empresas. Os principais princípios são o 13 e o 23, sendo esse último, importante para o Direito Internacional Humanitário, pois, na visão de Rachel Davis e da Cruz Vermelha, a aplicação desse princípio serve também na hipótese de entrega de armas a forças de segurança pública e particular: Princípio Orientador 23 letra C “(c) Considerar o risco de provocar ou contribuir para provocar graves violações de direitos humanos como uma questão de cumprimento da lei onde quer que operem” na ótica de Rachel Davis: “Principle 23 focuses on the first two scenarios described above – that is, where a company causes or contributes to an adverse impact. It is about making sure that a company has taken appropriate steps to avoid causing or contributing to gross human rights abuses – for example, when it provides weapons to public or private contracted security forces, that it does so in line with the Voluntary Principles on Security and Human Rights. It is not about imposing a ‘strict liability’ approach on companies” Devendo sempre levar em consideração que esses Princípios Orientadores não tem força vinculativa são consideradas “soft law”, o que dá maior margem também para as empresas aderirem mais facilmente, uma busca cada vez maior de diálogo entre a ONU e as empresas privadas a fim de uma menor intervenção nos conflitos armados.
[9] “1 – O Tribunal estabelecerá princípios aplicáveis às formas de reparação, tais como a restituição, a indemnização ou a reabilitação, que hajam de ser atribuídas às vítimas ou aos titulares desse direito. Nesta base, o Tribunal poderá, oficiosarnente ou a requerimento, em circunstâncias excepcionais, determinar a extensão e o nível dos danos, da perda ou do prejuízo causados às vítimas ou aos titulares do direito à reparação, com a indicação dos princípios nos quais fundamentou a sua decisão.” ( Artigo 75, número 1 do Estatuto de Roma)
[10] Clapham em sua entrevista à “Quellen zur Geschichte der Menschenrechte” lembra do caso Shell na Nigeria. Shell, empresa petrolífera, era uma grande apoiadora do governo e também uma das empresas que mais poluíam na Nigéria, quando ouveram diversos protestos liderados pelo ativista Ken Saro-Wiwa, este foi preso e executado, a Shell foi cumplice e não interviu para ser evitado tais atos contra o ativista, recebendo por isso diversas críticas e o governo Nigeriano foi expulso por 3 anos da Commonwealth por conta do ocorrido
[11] “Doe v. Unocal Corp. is a good example of case-law illustrating the application of this theory. In this case, which was heard at first instance in a US federal district court, the company Unocal was sued by citizens of Myanmar for aiding and abetting the Myanmar military in committing grave breaches of human rights. Several of the breaches referred to (torture, rape, forced displacement, etc.) would be violations of international humanitarian law if they were to take place in the context of an armed conflict, hence the relevance of this judgment here (…) In the second-instance judgment in the case, the Court of Appeals for the Ninth Circuit found that the district court should have applied a complicity theory borrowed from criminal law, namely that of aiding and abetting. In the grounds for its judgment the Court of Appeals said that, according to the conflict of laws theory in international private law, it was preferable to use international law standards to decide legal questions in cases based on a rule of the law of nations. The Court of Appeals provided three arguments in favour of the use of international criminal law standards in a civil case in domestic law: (i) international human rights law has been developed largely in the context of criminal prosecutions rather than civil proceedings; (ii) the distinction between a crime and a tort is of little help in ascertaining the standards of international human rights law because what is a crime in one jurisdiction is often a tort in another; and (iii) the standard for aiding and abetting in international criminal law is similar to the standard for aiding and abetting in domestic tort law” ( Caso ocorrido internacionalmente a respeito de responsabilidade por violações ao Direito Internacional Humanitário por parte da empresa com cumplicidade aos militares de Myamar julgado nos Estados Unidos).
[12] “This application of the aiding and abetting standard was followed by a district court of New York State in the Talisman case, in which a Canadian oil company was sued for collaborating with the Sudanese government in violations of human rights and war crimes committed in the context of the international armed conflict taking place in Sudan. Talisman challenged the use of the aiding and abetting standard, arguing that this theory did not applyto a civil claim under the ATCA. The Court ruled that this argument was unfounded: Talisman’s contention is incorrect. Its analysis misapprehends the fundamental nature of the ATCA. The ATCA provides a cause of action in tort for breaches of international law. In order to determine whether a cause of action exists under the ATCA, courts must look to international law. Thus, whether or not aiding and abetting and complicity are recognized with respect to charges of genocide, enslavement, war crimes, and the like is a question that must be answered by consulting international law. The theory of aiding and abetting seems therefore to be applicable in civil claims for violations of international humanitarian law, at least in the United States under the ATCA. It is interesting to note that, in order to determine the degree of participation required if a party is to be regarded as a member of a ‘‘joint enterprise’’, the English and Australian courts have used a concept similar to the theory of aiding and abetting. It will therefore be helpful to define ‘‘aiding and abetting’’.” ( o caso em questão, também retirado de Mongelard cita o caso do Sudão e Talisman Energy, o qual foi citado também por Clapham a respeito de violações contra o direito humanitário e a cumplicidade silenciosa.)
[13] “Three cases concerning German industrialists were heard by a US military tribunal under Allied Control Council Law No. 10, two of which are of particular interest here as they constitute precedents for holding companies responsible for a violation of international humanitarian law. In the first of these cases twelve top managers of the German industrial conglomerate Krupp were accused of, inter alia, war crimes for spoliation and plunder of public and private property in occupied territory and of war crimes and crimes against humanity for employing prisoners of war, foreign civilians and concentration camp inmates in arms factories in inhumane conditions” ( Caso ocorrido no Tribunal de Nuremberg, acerca de violação por parte da empresa de atos violava o Direito Internacional Humanitário durante os eventos da Guerra, conforme exposto por Mongelard).
[14] “In our opinion we are at the stage of emergence of a practice of founding jurisdiction of the courts of the forum (most appropriate) to adjudicate compensation claims brought by individuals against a foreign state for breaches of jus cogens rules and especially those safeguarding human rights, provided that there exists a link between such breaches and the forum state” ( Frase do Acórdão, discutindo a competência dos pedidos de indenização à violação de direitos internacionais humanitários)
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